28/05/2021 às 07h55min - Atualizada em 28/05/2021 às 07h55min
Escritor de PG lança romance "rock’n’roll" sobre a turbulenta vida de jovem universitário
Inspirado em amigo do autor, personagem leva uma vida de sexo, drogas e bebedeiras enquanto lida com a morte dos pais; leia trechos
Da redação
Foto: Divulgação
Um romance de formação que provoca questionamentos sobre o “eu” em meio a uma sociedade moralista que dita padrões de conduta e comportamento. Essa é a percepção resultante da leitura de “A Vida Interrompida de Fernando Bartan” (Artêra, 2021), o quarto e mais recente livro de Giovani Marino Favero, escritor e pró-reitor de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). O trabalho conta com ilustrações de Matheus Pillsky.
Na obra, que acaba de chegar às livrarias e já está disponível em diversos sites, Favero apresenta ao leitor o mundo paralelo de Fernando, um jovem que, no auge de seus 17 anos, sofre um grande baque ao perder os pais, ao mesmo tempo que ingressa na universidade. Enquanto, por um lado, ele precisa lidar com a morte prematura dos genitores, por outro vive uma vida desregrada em meio a festas, bebedeiras e drogas, sempre acompanhada de muito rock’n’roll.
“Ao narrar as transformações e mudanças de seu herói, Giovani Favero constrói a linguagem a partir de suas próprias experiências e amarras morais, denunciando um quê de alter ego na personalidade de Bartan. Trata-se de uma literatura quieta, cuja leitura se faz prazerosa pela sua simplicidade e na riqueza de sentir”, escreve o diretor de Qualidade de Vida no Trabalho, da Pró-Reitoria de Recursos Humanos da UEPG, Jeverson Machado Nascimento, no prefácio.
Em entrevista exclusiva ao portal ‘NCG’, Favero observa que a obra foi baseada na história de um amigo, mas que poderia ser a realidade de muitos jovens com sonhos interrompidos ou que mudaram o rumo de sua caminhada, assim como o personagem.
Do início da escrita ao produto final, foram quase três anos de trabalho e dedicação. “Comecei a escrever em 2016, após ver um documentário sobre Jim Morrison [vocalista da banda americana The Doors] e lembrei do amigo da faculdade que era apaixonado por The Doors. O livro foi concluído em meados de 2019, após um período que escutei muito as músicas dessa banda para poder entrar no estado de espírito do personagem”, relata.
Missão não muito difícil para o escritor, que cresceu ao som de Ramones, The Clash, Pixies, Nirvana, Pearl Jam, passando, no início da juventude, aos clássicos dos anos 60, como Beatles, Rolling Stones, The Byrds, Bob Dylan e a própria mítica banda de Jim Morisson.
“A Vida Interrompida de Fernando Bartan” é o quarto livro publicado por Favero. Os dois primeiros são formados por contos breves, baseados na observação do comportamento humano, com pitadas de humor, crítica e realismo, e o terceiro é um livro infantil, inspirado em uma história de adolescência e na relação do pai do autor com um cão. “Na ‘Vida Interrompida de Fernando Bartan’, vejo com alegria um livro trabalhado do início ao fim, com idas e vindas na escrita, e com essa relação visual e musical presente nele”, destaca o autor.
Na entrevista a seguir, Favero dá mais detalhes sobre a obra.
Há algo de biográfico em “A Vida Interrompida de Fernando Bartan”?
A base da história e pequenas passagens misturam o personagem principal e particularidades do autor.
Você acredita que há um aspecto "geracional" nesse novo livro? Lendo a sinopse e o prefácio, dá a impressão que ele retrata, de algum modo, um jeito de ser de toda uma geração.
Acredito, sim. A geração dos anos 90 via a universidade como algo glorioso e um local de aprendizado, cultura, festas, rock’n’roll, drogas e amizade. O livro tem um pouco de tudo isso.
O livro traz na capa algumas referências psicodélicas. Como a obra se relaciona com o universo do rock'n'roll?
O protagonista, Fernando, escutava diariamente The Doors, assistia inúmeras vezes ao filme do Oliver Stone sobre o grupo, era cabeludo, gostava de drogas, álcool, tocou baixo algum dia.
A obra traz alguma inspiração literária ou filosófica também? Há algum pensador ou corrente de pensamento que influencie o livro?
Vários, estamos sempre em construção. Mas, definitivamente, os livros dos escritores Charles Bukowski, J.D. Salinger, Chuck Palahniuk, Orhan Pamuk, Michel Houellebecq e Miguel Sanches Neto acabaram influenciando no processo criativo.
Para finalizar, você falou que Fernando foi um grande amigo. O que aconteceu com ele? Como ele está atualmente?
Continua sendo um caminhante na tempestade, seguindo as palavras de Jim Morrison: “Alguns nascem para o suave deleite; outros para os confins da noite”.
A seguir, leia alguns trechos do livro selecionados pelo autor
"Fechei os olhos e me senti vivo. A inversão timpânica associada a um soluço com frequências lentas me conduziu a outro lugar. Sentia que havia cores presentes no ar, transformando o que eu achava que me rodeava em uma espécie de aurora boreal. Repentinamente a percepção de tempo, cores, respiração com soluço fez me crer que eu estava flutuando. Ah, como queria ir até a lua. Não gostava do frio, e deve fazer frio no caminho até lá, pensei. Música, agora escutava o que sempre desejei, uma orquestra de pássaros regida por um roedor gigante, uma mistura de ratazana e toupeira. Aquele lindo ser com dentes gigantes precisava de um nome. Não, ele deveria ter um nome, um regente dessa qualidade deve ser muito conhecido. Se tivesse condições perguntaria para ele, mas, achei melhor apenas prestigiar a sinfonia oferecida."
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"Parei para analisar o telhado estilo europeu de uma casa, acho que estão na esperança da neve que um dia cairá. Bom, se o aquecimento global for um fato, ele precederá um segunda era glacial, que provavelmente fará com que os leves flocos de neve um dia caiam sobre esse telhado. Eu sei, a construção deve ser forte pois isso pode demorar alguns milhares de anos, mas é uma construção com um tijolo deitado ao lado de um tijolo em pé, que comédia. Acredito que tenha ficado mais de meia hora observando o telhado e, para a minha surpresa, no lixo dessa bela casa com cores desbotando encontrei um pequeno Buda de madeira. Senti a vibração das energias cósmicas que me levaram até aquele momento, quando peguei a estátua, que estava colocada delicadamente em um canto, separado, na cesta de lixo."
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"Preciso de algum som que seja irritante. Vou colocar na rádio popular da cidade, três a cada três musicas são ruins. Após algumas músicas e a ausência de efeito sobre a postura coronelista do grilo, eu resolvi apelar, fui até o quarto de Pedro, o chato, e peguei o disco do Osvaldo Montenegro. Criei coragem, coloquei desde o início e para seu espanto, após alguns segundos da voz monótona do cantor, o grilo começou a se movimentar com aflição. Ecdise! A música perturbou tanto que fez com que o inseto resolvesse trocar o seu exoesqueleto. Ah, o poder do Osvaldo. Comecei a me irritar também, aflito tentei trocar meu exoesqueleto me contorcendo todo no chão."