31/08/2021 às 09h06min - Atualizada em 31/08/2021 às 09h06min

ARTIGO: Voto obrigatório, um grande atraso, por Osni Gomes

Para tais cidadãos, a eleição não é nada além de uma obrigação e, por isso mesmo, os partidos não se preocupam com o processo de seleção criterioso de seus candidatos. Assim a corrupção corre solta

Por Osni Gomes
Foto: Divulgação
O brasileiro não gosta de votar. Vai por obrigação. E é baseado nesse descontentamento que temos, invariavelmente, uma péssima representação política em todos os escalões. O cardápio partidário é, antes de tudo, visionário, pois a escolha dos candidatos não é por qualificação, mas por popularidade. E neste festival de populistas se incluem representações que praticamente fixam currais eleitorais, levando à eleição, em absoluta maioria, candidatos de entidades, crenças e instituições que contribuem para desqualificar a administração pública e a política.

Nesse bolo todo se incluem profissionais de comunicação (neste caso não necessariamente com diploma de habilitação), pastores e religiosos de todas as seitas, militares de diferentes categorias, líderes sindicais e um número sem fim de pessoas que, de uma forma ou outra, se tornam populares e contam com a simpatia de parcelas da população. Quando essas pessoas assumem seus cargos é que vão de fato aprender a lida legislativa ou executiva, e se acercam de dezenas de aduladores, muitos dos quais já treinados e com experiência, nas assessorias em geral. 

Vale ressaltar que o Brasil, entre as 15 maiores economias do mundo, é o único país que mantém o voto obrigatório. Estados Unidos, China, Japão, Índia, Alemanha, Reino Unido, Rússia, França, Itália, México, Coreia do Sul, Espanha, Canadá e Indonésia não tem voto obrigatório. O Brasil, que é o nono colocado nesta classificação na ordem do PIB, é único onde o voto é obrigatório. Em todos os outros o voto é facultativo. Na nossa democracia o voto é facultativo apenas para os analfabetos. 

Isso quer dizer que o Brasil está isolado entre as democracias do mundo. Na maior parte delas, o voto é um direito. Ou seja: o eleitor vota se quiser, se achar que algum candidato de fato o representa, ou se achar que é necessário que sua opinião seja representada.

Aqui, no entanto, temos o que se chama de direito-obrigação. O cidadão não precisa apenas votar: mas tem a obrigação de fazê-lo. Quem descumprir, sofre sanções legais (sendo impedido de inscrever-se em concurso ou tomar posse de cargo público, não pode inscrever-se ou renovar matrícula em faculdade pública, não pode tirar carteira de identidade ou passaporte, não pode tomar empréstimos em bancos públicos etc). Em suma, perde os seus direitos civis-políticos, que só voltam quando regularizar sua situação com a Justiça Eleitoral. Sofre multa que varia entre 3% e 10% de uma UFIR, podendo ser multiplicada dez vezes dependendo da condição econômica do eleitor.

Dizem os defensores do voto obrigatório que a multa é pequena, mas as sérias consequências ao faltoso fazem com que parte do eleitorado vá votar para não ter esse dissabor e o nome manchado. Daí a facilidade de relaxar, votando em qualquer candidato, sem a menor pesquisa ou conhecimento, ou mesmo negociando o seu ato através de benefícios que vão de calçados, óculos, dentaduras a propinas pecuniárias. 

Para tais cidadãos, a eleição não é nada além de uma obrigação e, por isso mesmo, os partidos não se preocupam com o processo de seleção criterioso de seus candidatos. Assim a corrupção corre solta envolvendo políticos, assessores, e chega ao eleitor, esse descartável personagem, reivindicado a cada dois anos. 

Compactuar dessa política corrupta brasileira, só mesmo para um país em desenvolvimento, para não dizer subdesenvolvido, pois é lei de toda a democracia evoluída que o voto não seja obrigatório, jamais. 

Só com o voto facultativo é que vamos acabar com os currais eleitorais e melhorar a qualidade do pleito pela participação de eleitores conscientes e motivados, em sua maioria, e com candidatos selecionados e com real competência para os cargos.

Criou-se um "mito" (que palavra maldita) de que a participação eleitoral da maioria é uma virtude do voto obrigatório. Penso que é exatamente o contrário, pois não há qualquer evidência de que o voto obrigatório possa gerar cidadãos politicamente evoluídos. É o inverso: serão sempre os serviçais de interesses obtusos que se sobressaem. 

Vejo raras exceções, em nossa política, de homens que honram a atividade. Até porque admitir um analfabeto político votar ou se candidatar é uma temeridade, pois são eles que acabam escolhendo ou assumindo as representações que temos visto nas últimas décadas. Conte nos dedos os políticos respeitáveis que tivemos nos últimos 40 anos. 

Pelo voto não obrigatório, o mais rápido possível.

OSNI GOMES é jornalista aposentado, natural de Ponta Grossa, radicado em Curitiba

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